Olá mães e pais!

Vocês já se perguntaram quais os desafios que seus filhos e filhas podem enfrentar quando crescerem? Dentre tantas dúvidas sobre o futuro, a sexualidade da pessoa com autismo é uma delas. Um processo natural e esperado, mas que gera anseios em muitas famílias devido a preocupação em como este fenômeno é atravessado pelas dificuldades advindas do diagnóstico. Vamos conversar sobre isso?

A sexualidade de pessoas com transtorno do espectro do autismo (TEA) tornou-se um tópico de interesse à medida que novas demandas desafiadoras surgem entre a adolescência e início da vida adulta.  De acordo com a 5º edição do Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM-5), o autismo é caracterizado por déficit na interação social, nas habilidades de comunicação verbal e não verbal, interesses restritos e comportamentos repetitivos/estereotipados. Considerando estas características, as relações sociais de pessoas com TEA é claramente prejudicada pela inabilidade social, dificultando em particular a manifestação do interesse sexual e o interesse romântico. 

Outro fato que torna este período delicado, é que embora adolescentes com TEA entrem na puberdade quase ao mesmo tempo que seus pares com desenvolvimento típico, a maturação física muitas vezes não é acompanhada pela maturação cognitiva e social de forma concomitante. 

Como adolescentes e jovens adultos com autismo encaram sua sexualidade?

Em um estudo realizado aqui no Brasil por Lopes e colaboradores em 2018, foram entrevistados 5 autistas leves, homens, entre 15 e 17 anos, no estado do Ceará. Segundo os entrevistados, existe ainda uma negação da sexualidade da pessoa autista, principalmente vinda de pais e professores, em reconhecer autistas como pessoas sexuadas e não como “eternas crianças”. Outra questão levantada, foi a ineficiência da educação sexual escolar, que faz uso excessivo de abstrações (difícil para uma pessoa com autismo interpretar as informações, pois precisam de exemplos concretos), foco somente em aspectos biológicos e negligência de aspectos comportamentais. 

Em relação às mulheres, em um estudo semelhante realizado por Sedgewick e colaboradores em 2018 em Londres, foram avaliadas trinta e oito mulheres (19 mulheres autistas, 19 mulheres neurotípicas), com idades entre 20 e 40 anos, que completaram a questionários de avaliação psicológica relacionados a inferência social e relacionamentos, além de uma entrevista sobre suas amizades atuais e anteriores e relacionamentos românticos. De muitas maneiras, as relações sociais e as experiências das mulheres autistas eram muito parecidas com as das mulheres neurotípicas. Mulheres autistas, no entanto, tiveram maior dificuldade com habilidades de inferência social, ou seja, inferir o estado mental a partir das expressões faciais e tom de voz de outras pessoas, e relataram vivenciar situações sociais mais negativas por se considerarem mais vulneráveis socialmente. 

Apesar de mulheres com TEA serem mais vulneráveis a situações de risco, uma revisão de literatura realizada por Turner e colaboradores (2017) mostrou que mulheres com TEA podem apresentar déficits sociais e comunicativos menos pronunciados, comparado a homens,  e interesses mais compatíveis com os de seus grupos. Além disso parecem aplicar estratégias de enfrentamento, como imitar as habilidades sociais de mulheres neurotípicas, portanto, sendo mais socialmente discretas, levando a uma maior probabilidade de ter um relacionamento não só sexual, mas romântico.

Como lidar com os desafios vindos na adolescência e na vida adulta?

Sabe-se que cada pessoa com autismo possui demandas diferentes, que podem variar principalmente de acordo com o nível do transtorno (podendo ser de leve a severo), exigindo também formas diferentes de abordar e intervir. 

Ainda de acordo com a opinião de jovens entrevistados por Lopes e colaboradores (2018), para autistas leves, as principais demandas são sobre como se relacionar com outras pessoas, como conciliar desejo sexual e aversão ao toque, compreender as regras sociais relativas ao contato íntimo e social com outras pessoas. Para casos considerados severos, os entrevistados inferiram ser necessário trabalhar regras sociais e a relação com o próprio corpo.

Ainda há poucas pesquisas relacionadas ao tema sexualidade e autismo no mundo, principalmente no Brasil, carecendo de programas especializados de educação sexual e orientação aos familiares. O tema “sexualidade” em nossa cultura vem sempre acompanhado de tabus, e quando se trata de pessoas com alguma deficiência, geralmente está vinculado à  infantilização realizada pela sociedade, que subestimam ou ignoram a existência da sexualidade nesta população.  

Como posso ajudar meu filho/minha filha então? Como já escrevemos aqui no blog, entendemos que a preocupação dos pais com o desenvolvimento de seus filhos é angustiante desde o momento que recebem o diagnóstico, afinal, o que espera por eles na vida adulta e como posso ajudá-los? Neste caso, o primeiro passo é buscar compreender o desenvolvimento sexual do adolescente e jovem com TEA como um fenômeno possível e natural, tanto quanto seus pares neurotípicos, este já é um grande passo para identificar as necessidades deles, conversar abertamente e oferecer apoio. 

Dicas de como auxiliar seu filho(a)

Seguem algumas dicas para facilitar este momento: 

– Não punir quando há comportamentos sexualizados em contextos inapropriados, tentando o máximo possível desviar a atenção do indivíduo para outro foco. A punição pode ser traumática.

– Não usar metáforas e analogias para exemplificar, usar a linguagem mais concreta possível 

– Utilizar imagens, como vídeos, livros, séries, entre outros, pois ajuda a pessoa com TEA a compreender o assunto abordado

– Prestar e reforçar informações relacionadas aos limites relacionados ao próprio corpo (para que abusos sejam evitados), como também ao corpo das outras pessoas. 

Apesar das dicas, cada caso é único e sabemos o quanto a transição da infância para a vida adulta é desafiadora para adolescentes/jovens e seus familiares, sendo natural surgirem dúvidas e dificuldades no processo. Neste caso, o serviço de psicologia, ajuda tanto os jovens como seus familiares, a lidarem de forma mais saudável com essas dificuldades. 

Espero que tenham gostado do tema, nós da equipe Evolvere ficamos a disposição. Até breve!

Olivia Entrebato Kruger, psicóloga do centro Evolvere

REFERÊNCIAS

Sedgewick, Felicity; Crane, Laura; Hill, Vivian; Pellicano, Elizabeth (2018). Friends and Lovers: The Relationships of Autistic and Neurotypical Women. Autism in Adulthood, (), aut.2018.0028–. doi:10.1089/aut.2018.0028 

Turner, Daniel; Briken, Peer; Schöttle, Daniel (2017). Autism-spectrum disorders in adolescence and adulthood. Current Opinion in Psychiatry, (), 1–. doi:10.1097/YCO.0000000000000369 

Lopes, Samuel Verter Marinho Uchôa et al. Transtorno do Espectro Austista e Sexualidade>>Atas do 7º Congresso Iberoamericano de Investigação Qualitativa em Saúde, [S.I], v. 02, p. 1175-1180, 2018.

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