Ao retornar as atividades terapêuticas nesse ano de 2020 decidi que escreveria sobre um tema que venho fazendo muitas leituras, estudos e reflexões no universo da fonoaudiologia: a linguagem.

Tenho percebido nos últimos tempos que a linguagem vem sendo em alguns momentos esquecida por nós fonoaudiólogos em detrimento ao estudo de patologias.

Em algum momento por aqui já coloquei que temos nos tornando experts em patologias e condições de um indivíduo, mas temos esquecido de alguma forma nosso principal objeto de estudo que é de fato a linguagem (leia mais).

Penso que um fonoaudiólogo que deseja trabalhar com um indivíduo que apresenta alguma alteração na linguagem, necessita saber sobre o que de fato é a linguagem, quais os requisitos para o seu desenvolvimento e como ela se desenvolve.

Vamos a ela.

O que é linguagem?

Conheça algumas definições importantes

Quando estamos nos referindo a linguagem normalmente nos vem à mente que é a capacidade que o homem tem de adquirir formas para se comunicar. Mas o conceito de linguagem pode ser diferentemente interpretado conforme a área que o toma para estudo.

Uma das definições estudadas sobre a linguagem é que ela é uma capacidade inata, uma faculdade mental, que permite ao homem aprender por exemplo, uma língua para se comunicar. Essa definição fundamenta-se na base biológica da linguagem atribuindo quase que exclusivamente ao cérebro sua capacidade de desenvolvimento.

Outra definição de linguagem é a possibilidade de vê-la como um conjunto de signos que por meio de regras gramaticais pode formar um número infinito de significados. Esse olhar coloca foco na aquisição da língua, que como um sistema de estrutura fechada que se relaciona com regras e signos específicos. Essa forma de ver a linguagem é utilizada para os estudos na área da linguística.

Uma outra possibilidade de se pensar a linguagem é como instrumento de comunicação. Dentro desse olhar colocamos o homem como centro do estudo pois é através da linguagem que o mesmo compartilha informações tornando-se um ser social. Essa visão é intensamente estudada pelos campos da pragmática, da linguística cognitiva e interacional, onde se vê o movimento do homem imerso numa linguagem que muda constantemente dependendo das suas necessidades comunicativas e processos adaptativos ao meio.

Pensar a linguagem enquanto meio de comunicação

Se formos analisar essa última forma de pensar a linguagem, como forma de comunicação, veremos que ela não é exclusiva dos homens, os animais também têm essa capacidade.

Porém a comunicação humana é única, ela é exclusiva do homem pelo fato de possibilitar aos indivíduos produzir infinitas informações a partir de um número limitado de regras e pelo fato de ser exclusivamente adquirida em interação social.

O fator social

Esse é um ponto que devemos também considerar.. Os indivíduos que chegam à clínica fonoaudiológica normalmente apresentam atrasos e/ou alterações no desenvolvimento da linguagem. Voltando ao ponto que mencionei como reflexão no início deste post, estamos estudando condições do ser humano, patologias que incidem no ser humano e muitas vezes esquecendo o que de fato está submerso no universo da linguagem dentro dessa condição.

Estudamos a genética com afinco, assim como conhecemos o cérebro, mas de fato temos clareza dos aspectos da linguagem que estão em defasagem?

Temos clareza do meio social a que esse indivíduo foi exposto para que tal aquisição pudesse ser contemplada?

Existem estudos tanto na área da neurologia como da psiquiatria infantil demonstrando que para além de fatores genéticos ou orgânicos, como aqui queiram denominar, existe um ambiente social que incide de maneira importante no desenvolvimento de linguagem e também de suas  alterações. Existe um ambiente que pode estar sendo pouco estimulador ou favorável para a imersão do sujeito na linguagem.

Não podemos esquecer que a linguagem se adquire no seu próprio funcionamento, pois não se ensinam regras linguísticas para uma criança, ela simplesmente acontece ao passo que se fala com a criança ou se interage com ela. Há movimento na linguagem, há modificação de papéis, há identificação de papéis no ato da comunicação.

Porém não podemos ser levianos e atribuir ao fator social toda a “culpa” pelos déficits no desenvolvimento da linguagem. O social é UM fator a se considerar, lembrando sempre que existem predisposições para alavancar ou não o desenvolvimento do indivíduo.

Então se uma indivíduo tem um predisposição para apresentar algum déficit no seu desenvolvimento e encontra-se em um ambiente com pouco estímulo, pode este ser o fator que faltava para o atraso acontecer.

Também não podemos cair no senso comum de que CADA INDIVÍDUO TEM SEU TEMPO! Tempo no desenvolvimento infantil é fator precioso. No caso de atrasos de linguagem mais precioso ainda, tendo em vista as consequências que podem ser observadas ao longo da infância.

Por fim, o que desejo com esse e outros posts que virão sobre linguagem é instigar novamente meus colegas de profissão a fazer um retorno ao que considero nossas origens: estudar a linguagem. Se essa área de estudo for a sua inquietação, for o que te move, venha junto conosco, estude, leia, compartilhe aqui suas inquietações e contribua para o enriquecimento da nossa área antes que a linguagem se perca no universo da Fonoaudiologia.

Até breve,

Fabiane Klann Baptistoti

Fonoaudióloga Clínica


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